O documentário de Walter Salles sobre o cineasta chinês Jia Zhang-ke começa tedioso e vai assim durante um tempo.
Perguntava-me, enquanto isso, por que o diretor brasileiro o teria escolhido entre tantas outras possibilidades mundo afora? Não vi nenhum dos filmes do chinês e prefiro desconfiar da afirmação de que ele é “o cineasta em atividade mais importante do mundo”. Em algum momento, entretanto, o motivo da escolha vai lentamente surgindo: Jia Zhang-ke é um homem simples — um observador atento do mundo que o cerca, das pessoas e dos lugares que elas habitam — e que sempre teve dificuldade de exibir seus filmes no circuito comercial chinês.
Ele é considerado por muitos um cineasta de direita; ou seja, alguém que tem um olhar não totalmente alinhado ao regime comunista chinês. Um equívoco, claro. A esta altura a identificação com o personagem é plena e o filme ganha em interesse e intensidade.
A estratégia de abordagem de Walter Salles é simples. Ele entrevista Jia Zhang-ke e o acompanha em lugares que foram locações de seus filmes. Vemos o lugar, o motivo pelo qual foi escolhido e depois a cena do filme em que ele aparece. Há também depoimentos de atores, amigos e colaboradores do cineasta chinês.
A memória deles todos vai tecendo um retrato afetuoso do artista e de sua obra e os pontos de contato dela com a vida social e política da China. O tédio então dá lugar ao deleite e a inquietação.