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O Plano Perfeito


O Plano Perfeito, de Spike Lee, que você encontra na Netflix, começa com um primeiro plano do líder da quadrilha que assaltou o banco, cenário principal do filme, contra o fundo daquilo que claramente parece ser a cela de uma prisão. Ele nos fala, desde um suposto presente da narrativa, de como, quando, onde e por que, dias atrás, eles entraram na agência e fizeram pelo menos 50 reféns. O recorte do espaço logo a seguir reafirma para o espectador sua aparente condição de prisioneiro, encerrado numa “cela” suja e muito pequena.

Esse jogo sofisticado entre aparência e essência, que no prólogo é trabalhado (sugerido) a partir dessa relação espaço/tempo, será retomado outras vezes de diferentes maneiras ao longo da narrativa, pontuando-a de significações mais profundas se pensadas a partir do estado da vida social e política dos EUA no ano em que o filme foi lançado, 2006, e estará incorporado em filigrana a uma visão de mundo crítica e distanciada do diretor, subterrânea a uma trama policialesca imensamente bem dirigida, e que procura separar, dentro dos limites que o gênero impõe, o joio do trigo, e fazer vir à superfície relações sociais obscuras e interesses de classe bem pouco dignificantes.

Uma das primeiras ações da quadrilha dentro do banco será despir as vítimas de suas roupas e forçá-las a vestir macacões e máscaras iguais às dos bandidos. Com esse gesto, por extensão, elas são obrigadas também a despir-se de suas máscaras sociais e étnicas, que ficam diluídas no grupo indistinto de vítimas e assaltantes. A partir daí, aos olhos da polícia, da imprensa e da opinião pública, não haverá mais uma linha nítida que separe os inocentes dos culpados na aparência. A situação na agência, o caos instaurado, a espetacularização do evento, o medo e a paranóia generalizada passam a ser então uma espécie de microcosmo da sociedade americana daquele momento (e de hoje em dia também); pelo menos de um dos seus aspectos.

A continuação é uma trama intricada na qual, passo a passo, com saltos constantes de tempo (presente e futuro), vamos nos dando conta da motivação essencial do grupo e o porquê do assalto: o segredo obsceno e valioso guardado na gaveta 392 do cofre do banco que pode fazer de um banqueiro bem sucedido e respeitável um verme repugnante.


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